quinta-feira, 23 de agosto de 2007

O silêncio dos intelectuais

Estava vendo agora o programa da TVE "O silêncio dos intelectuais" (aliás, TVE e TV Cultura são boas demais, se você selecionar os programas - recomendo também o "Recorte Cultural" e "Café Filosófico", respectivamente). O programa tratou da questão do poder da mídia. A TV, a tela do computador ou do celular ditam o que é o real. Os recortes instantâneos que não são nada além do que a percepção individual de alguém, ou o modelo padrão para esses meios midiáticos. Mas são confundidos pela maioria dos "espectadores" com a própria realidade... Um intelectual francês estava falando nesse programa que se você meciona o Zidane pra qualquer ser no mundo, ele é reconhecido, enquanto que um matemático francês extraordinariamente jovem e brilhante, vencedor da medalha Fields (equivalente ao Nobel de Matemática, entregue apenas de 4 em 4 anos) não se conhece em lugar nenhum. (Nem na internet achei esses dados direito...) O Zidane cabe na tela, cabe no jornal, cabe na copa transmitida ao vivo pro mundo todo... É visão. É padrão. Mas e a Matemática? Filosofia e poesia ainda há em raros programas de TV e nesse maravilhoso e democrático meio que é a internet... Mas Matemática talvez nem aqui. É puro pensar, "episteme" grega, longe da "doxa", sensação, em que estamos constantemente mergulhados, onde tudo passa rápido e pronto e dado. Não temos nunca tempo nem disposição para silêncio, para pensar sozinho, estudar profundamente algo e - claro - menos ainda para criar. Por isso também é que os intelectuais parecem silenciosos, segundo o programa. Não cabem nesse esquema de mídia, logo ficam quietos ou em guetos. A meu ver, eis aí o grande risco de quem pensa ou escreve ou faz matemática, de quem cria de maneira geral: falar para cada vez menos gente. E penso que esses guetos tendem a se estreitar, se encolher. Por isso gosto da Marilena Chauí, que fala mais claro que a maioria (no programa, inclusive). Não é preciso usar um vocabulário tão cheio de requintes como a maior parte dos intelectuais faz... Acho que o mesmo problema há na poesia mais "aceita" pelas editoras hoje. Por isso, tende a só ser apreciada por poetas. Tento fugir desses "hermetismos pasquais" nas minhas. Apóio o retorno ao mais popular e simples, sem ser simplório, como Quintana na poesia, Beethoven na música clássica, Chauí na Filosofia. Mas sem os excessos também... Cabe aqui a "justa medida" Aristotélica ou o "caminho do meio" do Buda. As auto-ajudas imbecis são tão claras quanto as cabeçadas do Zidane, mas aí já começa a faltar a profundidade... ;)

(Fabio Rocha)

Um comentário:

Iaiá disse...

excelente...
enquanto buscarmos estar no mundo através dos padrões que ele nos impõe, não passamos de meros repetidores, escravos da mídia, sendo mercadoria para ser vendida. Não há espaço para criação nesse meio, somos somente peça igual a qualquer outra. A solidão pede a arte, a obra é a companhia, satisfaz essa necessidade, esse prazer. Não é preciso nada mais que isso... Beijos! I.