terça-feira, 26 de julho de 2005

e-book Acre Dito (2005) - revisado em 2014











Acre Dito

Fabio Rocha




Copyright © 2006 por Fabio Rocha - revisado em 2014




Registro EDA – Biblioteca Nacional:

Nome(s) do(s) Autor(es): FÁBIO JOSÉ ALFREDO SANTOS DA ROCHA
Título da Obra: ACRE DITO
No. Registro da Obra: 347828
Livro: 690
Folha: 488
Data de Registro: 25/7/2005
Gênero da Obra: POESIA
Obra Publicada: Não






Título original: Acre Dito




Editoração eletrônica: Fabio Rocha








Endereço eletrônico:
http://www.fabiorocha.com.br







Prefácio
Lucimara Sumie Hayoama


Há algum tempo a internet, grande promotora de tantos encontros fortuitos – alguns bem pouco prováveis, não fosse sua existência – fez cruzar o meu caminho a poesia de Fabio Rocha.
Possuidor de uma poesia incisiva, direta e sintomática, Fabio vem, através de Acre Dito, continuar a provar que é possível, com arte e talento, fazer mais com menos; sintetizar e dizer tudo; condensar, sem perder grandiosidade.
A dialética de Fabio é simples, breve. E bela. Não fica devendo, não sobeja, não necessita de aparas. Tem sagacidade e beleza suficiente para despertar os sentidos do leitor. E tem aí finda sua participação: até o absorto do que vai na alma de cada leitor. Sua escrita não busca conduzir para onde o poeta estava no momento em que o papel tomava vida em suas mãos: seus poemas despertam para um desejo, um pensamento, e então, sutilmente deixam a cena, cessam sua intervenção. Nem um milésimo de segundo antes de ter provocado, incitado, excitado nosso raciocínio ou sentimentos, ou raciocínio e sentimentos. A poesia de Fabio nos faz pensar; não busca conduzir, mas sim ser centelha de profundo alcance. Com algumas idéias nos identificamos, de outras, discordamos. Indiscutível é a harmoniosa comunhão entre as palavras. Seus poemas, seus curtos poemas, percorrem longas distâncias.
“É, você me lê direitinho....” me escreveu dia desses. Se só eu lesse – e entendesse – não haveria tantos elogios à qualidade de sua poesia, e Quintana não estaria certo ao dizer que, quando se lê e relê um texto, e não se entende, pode ser problema do autor. Entendo – penso que, ao menos - o que me conta a poesia contida neste livro. Acredito em Quintana. Logo, o mérito pelo entendimento não é somente meu.
Embora meus comentários possam soar como fruto de opinião parcial devido à amizade existente, é bom que o leitor aqui saiba, que a análise primeira foi feita somente sobre a obra. A amizade e carinho pelo autor vieram tempos depois. Indício é de desvinculação entre obra e autor, o fato de que nem quando nos desentendemos, certa feita, (somos humanos, iguais; e tão diferentes...) e o autor me mandou aos quintos dos infernos (com recíproca verdadeira, porém não verbalizada nem escrita de minha parte), deixei de acompanhar seus poemas quase diários. Como pessoa ponderada (que tento ser, nem sempre com sucesso), na época, o ódio (finito, *risos*) pela figura humana do poeta não influenciou na continuidade de minha apreciação do que assim o merece: sua poesia.
Alguns poemas, como por exemplo, “Acredito” ou “Variações Sobre a Mesma Busca”, nos levam, de maneira realista, a olhar para dentro e para os cantos, e enxergar nesse avesso, por vezes belo ou torpe ou disperso, as mesclas entre o que deveríamos saber de cor, e o que não deveríamos nunca, para nosso bem, dar-nos conta. Fabio utiliza como matéria-prima para sua poesia, uma xícara e meia do que recebe (ou toma) do mundo externo; meio quilo e mais um punhado do que cria e deixa crescer por dentro e; uma dúzia de palavras de encaixe conciso, suficiente para dar a forma e trazer à tona a sua idéia. Por último, na receita agridoce dos seus versos, Fabio acrescenta criatividade, inteligência, senso crítico e talento, generosamente a seu gosto e estilo.
Costumo chamar o poeta Fabio Rocha, às vezes em nossas conversas, meu “poeta vivo preferido”. Uma maneira minha de brincar fundindo o que penso realmente com o desejo de agredir - por sofrer a falta - a todos os que nos eram muito antes de nós mesmos, “xingando-os” de mortos. Já se foi ao longe aquele que se negava a ser “casado, quotidiano, fútil e tributável” em seus versos. Também nos deixou o que previa dias que viriam para “premiar-nos com uma laranja ou assassinar-nos de imediato”. Pessoa, Neruda e tantos outros... Muitos dos escrutinadores da essência humana (talvez os melhores, Deus me ajude a estar errada) passaram, e se foram; mas Fabio é prova de que eles deixaram, além de raízes firmes, muito de indelével e, graças a isso, três saudações para o alto: a poesia permanece. Clara e intensa. Mesmo que, por vezes,
não raras,
o acre
dite
as regras
insisto em repetir: a poesia permanece. Segue. Mas você não precisa acreditar em minhas palavras. Pode comprovar por si nas próximas páginas.

Lucimara Sumie Hayoama
http://lumevagante.blogspot.com








ACREDITO

Fica decidido
a partir desta data
que não sei quem sou
nem o que quero
muito menos como ser feliz.

A partir de então
é preciso
recomeçar.

Ah, mas tô cansado e tonto e desanimado e tonto e tonto...

Acredito ser
minha psicanalista
uma anta
porém
pode ser um deslocamento apenas
ou uma transferência
de quando eu tinha dois meses de idade
e não sabia quem era
nem o que queria
muito menos como ser feliz.

Mas era.

Fabio Rocha - 18/04/05



AMOR E MORTE

Dissolver-se aos elementos
virar árvore, carbono, pensamento
multiplicar-se em nada e paz
morrer....

Dissolver-se no outro
tornar-se mais por ser menos
derramar-se infinitamente em infinitos copos
metade cheios
amar...

A morte ama o amor:
o amor mata a morte.

Fabio Rocha - 08/05/05



AMAR O MAR DE LUCIMARA

Da não procura,
o encontro.

Um pé atrás
um passo no escuro
um tango argentino...

O girar
sem medo
mais perto...

O rosto aberto
os olhos tão perto
os lábios de certo...

O dormir desperto
(junto junto junto muito junto)
sonho antigo...

O silêncio após
a partida...

A água tenta nos olhos
água tanta na rodoviágua da partida aquosa...

(não
não era um filme dramalhão)

O fim-de-semana
foi um poema.

Fabio Rocha - 16/05/05



POETA VIVO

Estou no casulo
não há apuro
não há ar puro
não será o último
enquanto houver um muro
à mão
por destruir
à murros.

Vontade afoita
de espalhar a noite
como rastro de um vôo negro
pelo crepúsculo cortado
que é o outro
afastado
rasgado
morcego.

Nego mamíferos mariposas
(dentes trinco porta)
nego tudo
(dentes trinco porta)
negro.

Havia um tempo
em que perdia tempo
tentando
entender.

Fabio Rocha - 09/06/05



12 DE JUNHO

Lá vem mais um dia doze
lá vem o dia menos doce
sem namorada...

E continuo tonto
e a vida complicada
mais se complica
psicanalisada...

Dar de presente
mar de presente
a um ausente...

Tonto
tento nada
tendo nada
no entanto.

Fabio Rocha - 10/06/05




SPAM

Emagreça
dormindo:
morra.

Fabio Rocha - 17/06/05



MÁSCARA

De quando em quando
em casa
me trago em mim
(água)
uma raiva e uma força
(mágoa?)
irreconhecível.

Quase o Batman.

Fabio Rocha - 20/06/05



PSICANÁLISE FREUDIANA

Agarro a gruta
pela goela
com força bruta
olho em seus olhos
meus:
morte.

Dentes trincados
pelos eriçados
um gato que foge
pro escuro
por mais que se aperte.

(Seu tempo acabou)

Fabio Rocha - 02/07/05



PLANOS DE APOSENTADORIA NO ESCRITÓRIO

O teto tá caindo
a velhice chegando
o celular não tocando...

A calma tá correndo
o chefe não chamando
o relógio doendo...

Fabio Rocha - 08/07/05



SEXXXXXXTA

Estatisticamente
sexta-feira é o dia em que mais faço poemas
mas estatística mente.

Fabio Rocha - 15/07/2005



FASE LEGAL

Depois do domingo
vem a segunda
depois a terça
como se não bastasse
a quarta
então o inferno da quinta
trinca a sexta longa longa interminável...

Nos dois dias seguintes
aumenta o índice de depressão e suicídio.

Tenho pressa constante
mas nenhum lugar para chegar.

E no final da vida a gente morre.

Fabio Rocha - 21/07/2005



EDIFÍCIO MASTER

Trago em mim
o constrangimento
dos elevadores
e a solidão
dos documentários.

Fabio Rocha - 24/07/05



CAPITAL

Minto tanto
que acre
dito.

Fabio Rocha - 24/07/05



DA POSSE

Não passe a vida
reclamando:
a vida passa.

Fabio Rocha - 29/07/05



ESQUECE

Esqueçam meus poemas...
Quero casar, ter filhos, separar, enriquecer, gastar, engordar, emagrecer
e ser feliz vendo a TV aberta no domingo.

Fabio Rocha - 01/08/05



RESUMO DE BENS

Tenho
um livro de poesia
uma cama de casal vazia
e um celular que não toca.

Fabio Rocha - 10/08/05



GUSPE

Tenho plena consciência
(quase)
de que escrevo poemas em quantidade
por uma revolta íntima
contra a escrotidão
que é a realidade.

Fabio Rocha - 12/08/05



MUDA MUSA MUDA

Musa
muda
não te quero muda
nem musa...

Tira essa afetação imunda
desce do inalcançável
e vai limpar a bunda
dos filhos que teremos.

Fabio Rocha - 17/08/05



MOTIVO DA INTERNET

As grandes cidades
unem corpos
e separam almas.

Fabio Rocha - 20/08/05



VOU-ME EMBORA

Vou pegar
um avião.

Tudo confirmado
ajeitado
estou indo
muito breve
logo logo
meros dias
me separam
de pegar
um avião.

E voltar.

Fabio Rocha - 22/08/05



POEMA INCONSCIENTE

Será o tempo
o inimigo derradeiro
e o verdadeiro amigo
o final dos tempos?

Fabio Rocha - 24/08/05



A SCHOPENHAUER

Um passo atrás
no escuro:
o mundo não me quer
sem muros.

Logo
não quero
nada do mundo.

A massa
do muro
me fortalece.

Amassa
a dor
dos murros.

Que prazer
libertário
não esperar
não querer
não precisar
não temer
não me angustiar...

O resto é nada.

Embainho a espada.

Respiro.

Basta.

Fabio Rocha - 18/09/05



VARIAÇÕES SOBRE O MESMO MURO

Construo o muro:
é solitário.
Derrubo o muro:
tomo porrada.
Está escuro
não vejo nada.

Construo, é duro
disco arranhado.
E tudo escuro
na madrugada.
Estou impuro
porta fechada.

Construo o muro:
é solitário.
Derrubo o muro:
tomo porrada.
Está escuro
não vejo nada.

Fabio Rocha - 06/10/2005



INVENTO

Eu sou o vento...

De quentes asas
estuprando casas
cochichando orelhas
morte vida abelhas
espalhando a semente
soprando a saia de quem mente
carregando pipas
pólen
vida
prédios postes fábricas
inocentes e culpadas
que se danem as armas
com muitas dores e amores
(não venham falar de flores)
brinco
crio
e mato
o mato dança
corre corre
fogo espalho
brasa
ar falta
asfalto
fogo: fato.

Me fortaleço
com o calor da destruição
o caos pelo capital
e você não faz nada para mudar
além de comprar.

Não se preocupe com o mundo
que vai sobrar
para seus filhos e netos...

Eu sou o vento!
Vou TE tocar.

Fabio Rocha - 13/10/05



MAIS OU MENOS

Quanto mais coisas tiveres
mais coisas quebrarão
mais te preocuparão
mais te farão comprar acessórios de coisas
ou coisas mais modernas e mais rápidas e mais caras
e assim vai-se coisificando tudo
de mais a mais
sendo um pouco menos.

Fabio Rocha - 18/10/05



RIMA POBRE

A cada três segundos
morre de fome
uma criança no mundo.

Fabio Rocha - 23/10/05



TARDE EM BENFICA

Sol e frio
passarinhos cantam tristes
em gaiolas escondidas
(extremamente presos)
cantam triste e devagar
lembrando que tudo pode ser
devagar
mesmo em cidades
superlotadas de gente e pressa
noto as formigas
no cimento rachado da calçada torta
lembro da casa de minha avó
caminho
devagar
venta um pouquinho
sol que não faz suar
as casa velhas e mal pintadas
postes enferrujados
as fábricas ainda mais velhas e mal pintadas
funcionários lentos sempre pendurados
nos postes velhos, falando aos velhos telefones
paredes amareladas
um ciclista na contramão assobia e quase me atropela
ainda estranhamente calmo
vejo e ando e vejo e escrevo em minha mente
calma, ainda muito calma, estranhamente calma
venta fraco
e paro pra tomar sorvete.

Fabio Rocha - 04/11/05



PASSEI-O

"Eu só peço a Deus"
estou imune ao céu crepuscular
"um pouco de malandragem"
estou imune ao som (do oceano e de Cássia)
"pois sou criança"
estou imune à nuvem gigante e rosa
"e não conheço a verdade"
estou imune à estrela pertinho da lua
"eu sou um poeta e não aprendi a amar"
não estou imune aos casais
de mãos dadas.

Fabio Rocha - 05/11/05



INÍCIO DE FÉRIAS

(Para Débora Hübner)

Basta de gritos
Novo Hamburgo sussurra
o vento na taquareira
o tempo lento
os carros poucos
café da manhã sem pressa
companhia
mãos que se tocam
rios que se cruzam
ligações inesquecíveis
duzentos mil desconhecidos (indolores)
são mais que 2 milhões
Novo Hamburgo ensolarado
noite que não cai
pássaros que cantam como lá
pessoas que olham nos olhos
nas multidões menores.

Volto a mim
me vejo
me acho
me sou
andando na manhã da cidade
sem precisar fazer um poema
para fazer sentido.

Fabio Rocha - 13/11/05



DA POSSIBILIDADE DE UMA REJEIÇÃO PRORROGADA

Não venha
me adiar beijos
para um futuro possível...

Minha pressa
é uma presa
de minha ira.

Não, não nos conhecemos ainda
e, se pensarmos bem
nunca nos conheceremos
mesmo que vivamos
cem anos juntos.

O amanhã
não existe
em meu tempo.

01/12/05 - Fabio Rocha



POETRISTE 2

não sei se durmo
se corro
ou se morro

Fabio Rocha – 02/12/05



NOVA ORDEM

Não sei onde me lêem romântico...
No sentido romântico nhém-nhém-nhém, flor e amor...
Trago quatro facas e um canivete
na manga esquerda de minha língua
e dois lança-chamas contra a escuridão
do marasmo, da mesmice, da conformidade.
A minha arte arde na tentativa de um soco.
Atiro atrito metralho pelo despertar
sofro, choro, tento mudar
rimar de quando em vez
mas...

Fabio Rocha – 06/12/05



NÃO FUI EU

Não, não lhe enviei
flores azuis.

Não me conheces mesmo...

Se minhas,
seriam bonitas
seriam sofridas
e vermelhas
sementes
de dores
e amores
vermelhas
enfeites
cadentes
velozes
vermelhos
e vivos
e quentes.

Dúvidas esclarecidas, faça o favor de sumir.

Fabio Rocha - 08/01/05



DO NÃO QUERER ACORDAR

Marise vistosa
de batom vermelho
lindo lindo lindo
de Sousa
no meu sonho
findo.

Fabio Rocha - 19/01/06



CHEIRO MELÓDICO

Relaxante descoberta
em pleno 2006:
Paulo Leminski me era
bem antes da minha vez.

Fabio Rocha - 22/01/06



CHUVAS DE VERÃO

um tiro
dois tiros
tostines
no chão

chove
e a cidade
se alaga:
sangue, biscoito e água

Fabio Rocha – 01/02/06

segunda-feira, 25 de julho de 2005

e-book O Outro (2005) - revisado em 2014









O Outro

Fabio Rocha





Copyright © 2005 por Fabio Rocha - revisado em 2014




Registro EDA – Biblioteca Nacional:

Nome(s) do(s) Autor(es): FÁBIO JOSÉ ALFREDO SANTOS DA ROCHA
Título da Obra: O OUTRO
No. Registro da Obra: 347810
Livro: 640
Folha: 470
Data de Registro: 25/7/2005
Gênero da Obra: POESIA
Obra Publicada: Não




Título original: O Outro




Editoração eletrônica: Fabio Rocha




Endereço eletrônico:
http://www.fabiorocha.com.br











Sangro mas não choro
Rubens da Cunha


Fabio Rocha é um poeta surpreendente. Dono de uma produção contínua, publicada tanto em livros reais, quanto em livros virtuais. Objetos diferentes para comportar uma obra poética que se diferencia pela crueza direta da coloquialidade: “caralho, estou fazendo um poema” por aquela simplicidade aparente, pois seus textos estão agarrados no cerne das questões cotidianas: “Estou amargo como o aspargo que não comi”.

Neste “O Outro” há uma certa revolta, provocada pelo indivíduo preso na cidade gigante: “O que eu quero tendo raiva dessas manifestações mínimas que me aparecem milagrosamente numa cidade sem amigos, de amigos distantes, de amigos ocupados, de nenhuma amiga?” A solidão imposta pelo ambiente conturbado é combatida por Fabio com ironia, um preciso humor amargo, mas nunca negro ou agressivo. O humor dos poemas manifestam uma vontade intrínseca de que tudo poderia ser diferente, mas infelizmente não é.

Todas as relações humanas, as desconexões entre os seres, as dúvidas quanto à própria função de poeta neste caos, perpassam este livro, feito estiletes invadindo nossas verdades estabelecidas.

Fabio não considera sartrianamente os outros como inferno. Em certo momento diz “eu tento ser perfeito para o outro” e nesta tentativa (a tentativa de todos nós) erra e acerta, escorrega e reclama. Humano demasiado que é, expõe o os joelhos ralados no poema, imiscuindo o eu-Fabio Rocha, o eu-lírico, o eu-leitor numa coisa só. Mesmo quando se tranca, o mundo externo retém toda a sua atenção, a sua necessidade de ser compreendido. Em Umbral, um dos mais belos poemas do livro, percebe-se esta dualidade: eu x mundo.

Estou trancado.

Lá fora
leões
que amo.

A casa encolheu
ou eu que cresci?

Estou armado até os dentes.
Eles têm fome.
Ouço seus rugidos.

(Algo em mim quer ser um monstro.)

Cansado de ferimentos
olho para a porta
a chave pesando a mão.


O homem sendo diferente - a maldição da sensibilidade - deseja entre parênteses ser um monstro, pois lá fora estão os leões que ama, lá fora está a vida que o seduz e repele, “suicida sem coragem”.

Neste percurso cotidiano, de frieza, de mundo em guerra, os poemas vão dialogando com outros autores: Drummond, Cecília, Cazuza, vão tentando entender a força descomunal da contemporaneidade consumista, alarmista, indiferente: “o cotidiano me cospe me corta me cota em minhas costas o peso do não ser”, ao mesmo tempo em que busca soluções: “É parando que se chega perto de ser você mesmo” e no meio de tudo tenta convencer o labirinto que há firmeza e vontade.

No alto desta poética afetada pelo mundo externo, que busca diálogos interpessoais com “morcegos absurdos”, o poeta grita: “sangro mas não choro”. Estaria mentindo ou dizendo a verdade? Descubra você, invadindo este “O Outro” descobrindo-lhe as artimanhas e a beleza.

Rubens da Cunha
http://www.casadeparagens.blogspot.com












FOGO: ARTIFÍCIO

“Você sai de perto
eu penso em suicídio”
Cazuza

(Para Viviane Marques)

A paixão, chama de um gato
(cheio de carrapatos)
corre por dentro em mim sem botas
renovando-se, repetindo-se, crescendo
com o Bolero de Ravel
procurando um canto calmo
para explodir
num orgasmo alto
e me levar com ela
e me lavar com ela.

19/06/04



SOLTEM MEU BRAÇO

“Hoje eu acordei com medo, mas não chorei
nem reclamei abrigo.
Do escuro, eu via um infinito sem presente
passado ou futuro.”
Cazuza

Sou aquele
dos grandes pensamentos
filosófico-existenciais.

Que se perde
em palavras
e sonhos altos demais.

No entanto
no básico
cotidiano, simples, real, abominável
sou só
(suicida sem coragem).

22/06/04



HOMEM: PÁSSARO

Há um ninho torto
que faço
em desalinho em minha mente
e passo
simplesmente ao acaso das feias tranças de fora
(espantando amigas formigas ambíguas que não como nem saem de perto)
espasmos
de um lar que duramente a mente faz
(e facilmente se desfaz)
e me faz bem
quente, seguro e meu
dentro.

16/07/04



SILENCIOSO FRIO

Estou amargo
como o aspargo
que não comi.

25/07/04



NOVA FORMA DE VIDA

Pressa ou bebida ou imprudência
ultrapassagem ou derrapagem ou sacanagem
uma cambalhota duas cambalhotas
uma pirueta duas piruetas
ferro range
metal corta carne
osso entorta
cartilagem
estalo
escuro.

Silêncio imundo.

Se o mundo se move
se a perna não se move
se a morte se move
se a vida se vai
não se sabe.

O homem-carro
(aracnometalóide antropofagis)
está só
e agora não tem pressa de chegar.

Seus olhos grandes de medo
não vêem luz no túnel do fim.

10/08/04 - O trânsito segue matando mais que qualquer guerra e seguimos usando carros.



NOTURNO

A Mozart e Artur da Távola

Não, não nos basta
o chão.

Por isso, é preciso
vestir-se de estrelas
e cavalgar o sonho
no ritmo do divino.

Esmagados contra a terra
pela grave e forte gravidade
voltamos a face para o céu.

Na alma humana
cabe o universo infinito.

14/08/04



ILLUMINATA

O silêncio da tarde me incomoda.
O silêncio do tarde me arde.

Vou com o vento
coração aberto
carteira vazia
mãos imperfeitas
imaginando o toque da alvorada.

24/08/04



UMBRAL

Estou trancado.

Lá fora
leões
que amo.

A casa encolheu
ou eu que cresci?

Estou armado até os dentes.
Eles têm fome.
Ouço seus rugidos.

(Algo em mim quer ser um monstro.)

Cansado de ferimentos
olho para a porta
a chave pesando a mão.

08/09/04



SEM TÍTULO

Tenho tentado. Ando pelo quarto salgado e não acho o que procurar. Tenho tentado. O tempo, sem passatempo, passa lento. Mas tenho tentado.

11/09/04



SURPLUS

De vez em quando o mundo se divide em tantos mundos que me acho imundo irresponsável adulto demais para tanta indecisão. Sobra idade cronológica, sendo o tempo relativo... Sim, eu vi o documentário Surplus no GNT nesta data querida. Sim, pregava o anticonsumismo como eu um dia preguei nas paredes imaginárias de revoluções de papel que deste não saem. Sim, mas por que isso ainda me toca, me faz criança, me chora, me morde, me culpa? Eu que tinha desistido de pregar o inútil e crescer na moeda... Eu, que briguei com o ócio e fiz as pazes com o Marketing pela sobrevivência de meu ego num possível futuro apartamento próprio meu meu meu onde culpas por ser um parasita familiar de quase trinta na casa paterna e ainda sem emprego fixo de oito horas diárias não entrariam. Não entrariam... No entanto, ainda tateio no quarto não meu com colchonetes para a yoga que não faço atrapalhando a passagem. Também não tenho meditado... Sobra tempo. Que vai ser quando crescer? Drummond ecoa nessa mente velha de criança. Que vai ser quando crescer? Assistente de marketing, Mestrado em Literatura Brasileira, concurso público, poeta, psicanalista futuro, auxiliar administrativo, webdesigner, poeta, contista, ufólogo passado, poeta, desconfiado, quase tarólogo, perdido e (poeta) mal pago. Tateio o ato que de fato eu deveria mas não me conheço. (Nem sei mais se escrevo prosa ou poesia ou porcaria.)

17/09/04



TRÓIA

“Todo dia é dia de viver.” – Lô Borges

Eu subi no cavalo.

Ninguém poderia tê-lo feito em meu lugar.

Eu subi no cavalo
por mim.

Não importa como
não importa quando
muito menos para onde.

Eu subi no cavalo
sob a lua e o sol
apertei as rédeas
sem culpa ou dúvida
celebrei sozinho
e segui o caminho.

Eu no cavalo
o vento novo
eu no controle
a estrada agora linda
o cavalo meu.

22/09/04



STELLA

A estrela
dança branca
no céu de sábado.

Silenciosa e futura.

29/09/04



JORNALZITO

Um homem-bomba sunita
destruiu a mesquita
lotada de xiitas.

07/10/2004



ENROLADOS

Stella e a toalha
Stella é a toalha
circular
eterna
infinita

toalha
girando girando...

Tão longe
quanto eu de mim.

Parecia um fim
mas não houve começo.
Parecia sim...

Stella girando...
Toalha branca...

Quando chove
também temos
que fazer a barba.

Stella girando...
(mais rápido que minha pressa)
Toalha branca...
Sinal vermelho...
Mãos indecisas...
Línguas travadas...

Na tomada
novamente
líquida fica a dor.

É, aceita a derrota
embainha a espada
e vai fazer a barba
com a marca registrada.

20/10/2004



VISTA DO ESCRITÓRIO

Sentado de frente à tela
com a janela ao lado
e o relógio multiplicado
leio
que “para escrever é preciso nunca estar satisfeito”.

Nessas tardes de sexta-feira
dá uma vontade danada
de explodir.

No entanto, algo me segura
se segura
e só sai da cadeia
por palavra.

Cura?

12/11/2004



COMO FICAR RICO, TER AMOR DE SOBRA E SER FELIZ EM POUCAS PÁGINAS

O quarto está claro. Luz branca, como uma cozinha. É bom estar num lugar claro numa noite tão fria. A luz parece afastar qualquer ausência. O som da chuva batendo nas folhas lá fora convida à introspecção. Leve. Calmo. É hora de começar um romance.


Escolhi o caminho errado em algum ponto... Ou vários. Mas estava disposto a achar o certo, custasse o que custasse. Ana me falava o dia todo sobre coisas que não interessavam minimamente. Cor de cabelo, o filho do artista que não era dele, uma bolsa que ela queria comprar mas estava cara... E eu sabia que ela queria que eu dissesse “Não faz mal, compra.”, mas não dizia. Fingia não saber. Olhava o tempo todo a sopa de ervilhas, que comia lentamente. Silêncio. Agora eu sabia, mesmo sem olhar o rosto de Ana, que ela estava se emputecendo. Em breve viria alguma reação disfarçada por parte dela. E eu fingiria não notar também, para evitar piores brigas. Mais alguns minutos de silêncio. A sopa estava boa. Ainda quente. Coloquei um pouco mais de azeite. Ana é que bancava a sopa, o azeite, a casa, tudo, mas mesmo assim queria uma aprovação para comprar a maldita bolsa, que eu - mesmo assim - não dava. Tentava entender porque não dizia logo o que ela queria ouvir, mas não dizia. Saboreava o silêncio e a sopa. Ela interrompeu:

- Você que acabou com o sorvete de morango, Felipe?

- Ana, quem mais poderia ter sido?

- Felipe, aquele sorvete era para a Rosineide! Ela adora sorvete de morango!

Era assim que ela tentava me diminuir, lembrando que sou um escritor fodido que não tem grana nem pra comprar sorvete de morango... E tenho que me sentar ali com meu amor morto e ouvir que o sorvete era para a empregada.

Não respondi. Minha vingança foi chupar a colher cheia de sopa ruidosamente. Ana foi pro quarto e se trancou. Ergui os olhos para a janela da cozinha. A lua devia estar sobre o mar em Copacabana, linda mesmo. Mas tudo o que eu via era a parede descascada do prédio vizinho, e ouvia os cães latindo na noite do subúrbio carioca.



Teria que trabalhar em algo que não gostava, pois o que gostava era ler, escrever e filosofar. Mas não conseguia sobreviver disso, nem aturar Ana, meu sustento.

Sim, eu sempre soube que o trabalho fora uma invenção católica, para cansar o corpo e livrá-lo dos “pecados da carne”, posteriormente reforçada pelo Protestantismo, com seus dogmas do tipo “mente vazia, morada do demônio”. Sem falar na praga lançada sobre Adão, quando expulso do Paraíso. Praga que agora parecia se abater sobre mim... Grandes portões se fechavam às minhas costas, enquanto a sopa esfriava a minha frente.

Sempre soube que a imensa maioria das pessoas trabalhava explorada por não ter outra opção de sobrevivência, e a minoria privilegiada o fazia para fugir de si, pelo status, pela necessidade consumista de comprar mais e mais... Raríssimas exceções viviam fazendo o que gostavam. Eu mesmo não consegui...

Sempre soube que as máquinas cada vez mais tiram emprego de trabalhadores com funções braçais. E, paradoxalmente, o nosso ensino (público e privado) cada vez mais prepara pior os futuros trabalhadores que, sem empregos braçais e despreparados para empregos mais “intelectuais”, aumentam as estatísticas de desemprego.

Eu sabia demais. Pra quê saber tanto, meu Deus? Houve um tempo em que pensei em ser professor para revolucionar esse sistema educacional de alguma forma extraordinária, ou pelo menos para dividir essa sabedoria com alguém. Mas não passei nem na prova para o Mestrado, com questões absurdas sobre termos herméticos. E, sem um título, não se pode fazer nada por aqui. Por mais que não se aprenda nada de útil numa graduação ou numa pós-graduação. Por mais que a grande atividade nesses locais seja a das máquinas de xerox.

Ah, leitor... Esse Felipe que sempre valorizava o ócio, a contemplação... Que criticava o uso atual da expressão utilizada nos campos de concentração nazista “O trabalho liberta”... Queria se libertar. E teria que se libertar pelo trabalho nazista, pelo trabalho alienado, pelo trabalho sem paixão, pelo trabalho em troca apenas de um maldito salário.


Ana, em seu quarto, organizava os armários, lotados de roupas em excesso. Após isso passaria uns dez cremes e tomaria uns quinze remédios para evitar a velhice inevitável.

Rosineide chorava com sua novelinha, e dormia, exausta, com a TV ligada.

Eu pensava sobre os males do mundo, filosofava longamente olhando e janela, deixava os pensamentos fluírem, se misturarem... No entanto, sempre voltavam a Rosineide. Raiva. Era raiva. Como a que senti no dia em que ela interrompeu minha meditação transcendental com risadas. Devia achar a posição de yoga ridícula, ou eu ridículo na tal posição. E agora, eu teria que guardar sorvete para aquela imbecil.

Aliás, ela vivia rindo. Com motivo ou sem. Onde achava felicidade, meu Deus? Uma anta sem visão de mundo, que não sabia anotar um recado quando atendia o telefone. Uma mula de carga que passava mais de oito horas por dia limpando, cozinhando, passando roupa, fazendo tudo para os outros. Que se tivesse meio neurônio já tinha se matado ou entrado para o tráfico de drogas. Que não tinha casa, que não tinha um amante, um amor, nada. De onde saíam aquelas infindáveis risadas de hiena?

Percebi que minhas mãos estavam espremendo as bordas da mesa, como que buscando o pescoço gordo de Rosineide. A imagem da desgraçada morrendo em minhas mãos me deu prazer. Poder.

E ainda tinha um radinho. Um maldito radinho de som péssimo, que eu era obrigado a ouvir quando ela limpava a casa. Quantos walkmans já dei para esta criatura? Perdi a conta. Ela não usava. Agradecia, guardava ou vendia, mas não usava. E a casa não sendo minha, o salário dela não sendo pago por mim, como exigir qualquer coisa?

Fui dormir no sofá, com uma pressão no peito. Morna. Não dormiria nem tão cedo.


Pela manhã, saí pela cidade. Desci a ladeira da maldita rua de Ana e vi a vizinha manca subindo. Senti tanta pena dela subindo sozinha que não a cumprimentei. Seu marido, Parmênides, tinha morrido. A vida é assim mesmo, cruel. Por onde andaria agora o companheiro da vizinha, seu apoio nas ladeiras da vida? O cara vivia na janela do primeiro andar do prédio vizinho, fumando e escarrando ostras no quintal da casa da Ana. E, sempre que estava ali, naqueles poéticos instantes, procurava desesperadamente alguém para puxar assunto. Eu saía meio abaixado, fingindo uma concentração que não tinha, se pudesse, saía de casa invisível quando ouvia sua tosse ou sentia sua presença ali na janela. Era um pigarro que queria dizer “Estou aqui, fale comigo!”. Eu fingia não ouvir. Mesmo assim, muitas vezes ele começava a falar. Falava do tempo, ou temas semelhantes e metade eu não entendia. Era meio grulha nosso vizinho falecido. Eu não compreendia e concordava e dizia ter pressa e saía. De quando em vez ele trazia uns aipins que tinha colhido num sítio, não lembro onde. Ana agradecia, Rosineide cozinhava e eu, Felipe, comia.

Não sei mesmo o nome da vizinha manca que sobe a ladeira com dificuldade, viúva, nesse frio ferrado que está fazendo ultimamente.


A cidade do Rio de Janeiro acordava. As padarias abertas, com trabalhadores se preparando para mais um dia, tomando café com leite em copos de vidro. Um borracheiro espantando pombos batendo com uma chave inglesa numa placa de proibido estacionar. Um vizinho do borracheiro reclamando pelo barulho, que havia lhe acordado. Ainda estava frio. Frio não combina com esta cidade maravilhosa que é o Rio de Janeiro, mas estava bem frio.

Caminhei pelas ruas sem destino certo, mas não consegui escapar da minha dúvida: será que terei que me juntar aos das padarias? Ou será que meu romance – este romance – me salvará? Pensava num título para ele... Num título que atraia o leitor. Tem que ser forte e universal. Talvez algo como “COMO FICAR RICO, TER AMOR DE SOBRA E SER FELIZ EM POUCAS PÁGINAS”. Foi quando encontrei com tio Sávio. Quase nos esbarramos. Ele seguia curvado, ombros preocupados, pasta cheia de obrigações sem sentido.

- Opa. Felipe? Saiu um concurso público pra prefeitura de Nova Iguaçu, você viu?

Este era o “tudo bem?” do tio Sávio. Ele era fiscal, odiava seu emprego e cismou que eu devia ser funcionário público, que teria mais garantias... Eu era bem preparado, tinha uma faculdade e passaria fácil em algum, insistia. Mesmo sabendo que eu já tentara vários e não conseguira. Depois disso ele sempre dava uma reclamada da vida e, por algum motivo estranho, eu sempre acabava falando demais da minha própria vida pra ele. Ele dava uns conselhos óbvios que me irritavam, mas eu sempre falava demais, reclamava demais, me colocando numa situação de alguém que parece querer ouvir conselhos. Quão complexas as relações humanas... Tio Sávio começou a aconselhar e ouvi. Senti um desconforto por ter que ouvir aquilo e desconversei, inventei um compromisso e ele foi encarar o seu metrô superlotado diário. Eu até que gostei de falar com ele. Sempre gostava, no fundo. Não sei, racionalmente, o porquê.

Dei outra olhada pra padaria, onde já havia um cara bêbado àquela hora da manhã, tropeçando e xingando alguém imaginário, com plenitude de gestos. Possivelmente falava para o vazio tudo que não podia falar para seu chefe, aquele capitalista que lhe explorava. A imagem de Ana me pareceu menos sombria, sua casa mais agradável e sua empregada apenas uma pobre companheira que não se alimentou bem na infância, que estudou mal nesse ensino miserável e não teve oportunidades melhores para evoluir como espírito de Deus. Coitada.

29/11/2004



PESCARIA

Com quantas linhas se faz uma lagoa?

16/12/04



CINZA ARCADE

Continuo tonto,
continuo tenso,
continuo, tento
seminu o sonho,
seminário e lenço
- semear, eu penso -.

Se não chego logo,
sinuoso dente
mastigando carne,
mascando chiclete
de mertiolate,
atacando marte
sem sair de dentro...

A tarefa é grande,
Atari não jogo,
isso não acaba
no mesmo lugar,
no mesmo lugar

sem passar de fase.



NOVO ANO NOVO

Este peito que não ama
(só paixões de artifício)
é tambor tentando libertar
o som invisível.

Explode
como se pânico
motivo fosse
para continuar a semear vermelho
sob a pele branca.

Lá em cima
um céu novo
estampado de estampidos e vésperas
cheio de histórias interrompidas
do ano passado a ferro.

Cato cacos e pistas decorridas
mas não há como entender
as sem razões do órgão

em seguir pulsando.

02/01/05



TRINTA

Trinta minutos para o fim do expediente e eu dirigir trinta minutos para chegar em casa às seis e trinta e jantar em trinta minutos e ver TV por vários trinta minutos e me lamentar por trinta minutos por mais um fim-de-semana sem sentido cheio de trinta minutos sem paixão antes de dormir.

07/01/05



SEMI-ÁRIDO

O menino com o pé na rua deserta
procura emoção
sem chamar por ela.

Precisa
e não precisa
do Outro.

O menino caminha.

Ardem suas costas
áridas.

Além do perto
talvez haja...

No entanto, o perto
o pó
o menino
o passo
deveriam
bastar?

Não...

É preciso emoção.

Pássaros
sobre passos
que passarão.

02/02/05



TIÊ SANGUE NA POUSADA DA FLORESTA

O poema
chama
das matas

(promessa de novo dia)

Oceano
verde
e vasto
ronrona.

Pingos de sol
na água.

Andorinhas
recurvam a tarde.

Esfria.

Ilha Grande, 06/02/05



DO SONHO BESTA

Sim, terei um apartamento mínimo
todo meu
só meu
inteiramente meu...

Para que eu possa
reunir todos os amigos que não tenho
e jogar pôquer.

21/02/05



ESCRIT-ÓRION

Uma mesa e uma tela
uma musa:
uma janela.

24/02/05



DO ESCREVER

Mais importante do que saber a origem arcaica das palavras
seus múltiplos significados e traduções
suas rimas e ritmos
é ter algo a dizer
com paixão.

27/02/05


(Fabio Rocha)