terça-feira, 16 de dezembro de 2008

SEM SAL

Enquanto o tempo
se despede
desliza
desmancha
surfamos sem prancha
pelo mar sem conchas.

(Fabio Rocha)

sexta-feira, 12 de dezembro de 2008

FUNDAMENTAÇÃO POÉTICA 1: ANSIEDADE COMO BEM

A base de minha poesia é a pressa.

Escrevo antes que o poema passe
antes que eu me critique
me encontre
e morra.

Escrevo antes de qualquer revisão ou cuidado excessivo
com as novas regras gramaticais
sem pensar no FBI
ou na ABNT.

Antes de tudo
antes que o poema morra.

(Fabio Rocha)

CHOQUE (TERAPIA INÚTIL CONTRA A TIMIDEZ)

Para Machado de Assis

Os olhos de Capitu
quando encontram
no infinito segundo
meu olhar cansado
libertam (e matam) pombas seculares
(bombas nucleares)
abrigadas nas calçadas do plexo.

Entanto, as mãos não movem
as mãos não movem não
as mãos não movem
como sempre não moveram
resolutamente não movem
rumo ao que quero
e tudo passa
escapa
e vivo morto
morto vivo
agarrando minha raiva
a volantes de automóveis
e versinhos por fazer
eterna mente.

(Fabio Rocha)

segunda-feira, 8 de dezembro de 2008

AMOR FATI 2 - A REVANCHE

Para Bob Dylan

A dor do dia no apartamento sozinho
me pesa as pernas.

A louça por lavar me olha entre panelas, suspiros e literalidade.

Uma baleia de aço
canta sofrida em algum ponto perto
asfalto.

Ar falta
na ansiedade concentrada
entre o peito e os braços abertos
ansiedade pulsante que se torna
tempestade crescente
Beethoven
e então
letra e palavra...

Palavra escrita
pela voz não dita
voz não dita no apartamento que me aperta o dia
agita antes de usar
aperta e pulsa e uso
relógio no pulso pulsando a vida passando em medidas exatas
entra as minhas asas fechadas e a nostalgia do que não faço
matemático.

Mas algo me mostra que
apesar de tudo e de nada
o momento é perfeito
o momento formado por todas essas partes do todo caótico
e a gaita de Bob Dylan
e a baleia indefinível em algum lugar por perto
algum lugar por certo que não se pode ver pela janela
(tiros ao longe, tiros dos jornais de amanhã)
a solidão da plenitude...

Nada poderia ser diferente no dia
na minha vida
no mundo
ou no universo
pelo bem desta canção.

(Fabio Rocha)

(Este poema interrompeu o belo, louco e longo filme "Não estou lá", sobre Bob Dylan, passando agora no Telecine Cult.)

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

SONHOS DE VOAR

Chove.

É tarde
ou talvez cedo:
a verdade
é o medo
da morte.

O que arde
no canto
das asas
abertas
atônitas
despreparadas
para a solidão do céu.

O fundo
do abismo
é o mundo.

Sonhar em voar
e cair
e morrer
a toda hora
morrer um segundo
morrer a criança
que sonha e não voa
é triste.

(Fabio Rocha)

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008