sexta-feira, 12 de março de 2010

AS HORAS

Para Virginia Woolf e todas as minhas psicanalistas

estou leve
e quero fazer um poema longo
aninhado no que sempre fui

odeio festas

mas isso é um detalhe

em algum lugar do mundo
deve haver um artista ruim e feliz
dançando a macarena
a micareta
a pocahontas
algo assim

dito isso
o poeta morrerá

atirar

atirar-se

atirar
o vazio
do peito
pra frente
e passar
a vida
correndo atrás

e chegar

alto

do alto do morro

do ponto de máximo
da parábola fria

os escritores enxergamos
por baixo dos sorrisos, conformismos e segurança
o lindo terror humano

nosso olhar
não é jamais apático
menos ainda atento ao que deveria

queima de algo mais forte e fundo
como um mar que invade um quarto seco e quadrado
em segundos

sal

o sal do mundo

(ovos que se quebram)

desistir é renascer

os trens nos atraem
traem
traíras
traímos
gostamos de passear

vozes

silêncios

nada ou ninguém nos pode curar

lutamos
sozinhos
no escuro

e conseguimos tornar mais doente
pelo menos um pouquinho
esse mundo são

(Fabio Rocha)

10 comentários:

Nine disse...

Nada ou ninguém, pode nos curar!
Beleza fria de verdade cortante!

amei.

beijo

Angel disse...

Eis a face, e a sina, dos escritores.

Adorei o texto! Parabéns, poeta!

Fabio Rocha disse...

Obrigado, meninas. :)

Luiz Libório disse...

Parecemos tão alheios... Mas estamos tão por dentro... =)

Fabio Rocha disse...

Meu amigo Luiz, obrigado por tb odiar festas... :)

Canteiro Pessoal disse...

Fabio,

as horas, nas horas vá sempre: nas flores do mais.

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Devagar escreva
uma primeira letra
escreva
nas imediações construídas
pelos furacões;
devagar meça
a primeira pássara
bisonha que
riscar
o pano de boca
aberto
sobre os vendavais;
devagar imponha
o pulso
que melhor
souber sangrar
sobre a faca
das marés;
devagar imprima
o primeiro olhar
sobre o galope molhado
dos animais;
devagar
peça mais
e mais e
mais.

Cesar, Ana Cristina

Abraços vaso!

Priscila Cáliga

Fabio Rocha disse...

Priscila, adoro suas leituras! Obrigado por dividi-las! Há braços

Anônimo disse...

Esses poemas como a vida, de viagens sem volta, são encantadores.

Beijos.

Fabio Rocha disse...

Que bom ter curtido, Lara! Beijos

Fabio Rocha disse...

"Estou perdendo as minhas
ilusões, talvez, para adquirir
outras novas".

[Virgínia Woolf]